domingo, 30 de junho de 2013

Ruínas da Igreja do Rosário dos Homens Pretos de Muribeca

Por James Davidson



As ruínas da Igreja do Rosário dos Homens Pretos ficam localizadas no Povoado de Muribeca dos Guararapes, município de Jaboatão dos Guararapes. Situada na parte mais baixa do povoado, no extremo sul da Rua da Matriz, a igreja fica no lado oposto à Igreja Matriz do povoado, também sob a invocação de Nossa Senhora do Rosário. Sua condição de ruínas é um dos aspectos mais característicos e peculiares da localidade.


O povoado de Muribeca data do primeiro século de colonização em Pernambuco – século XVI, sendo um dos principais centros açucareiros da antiga Capitania de Pernambuco. Chegou a possuir cerca de 20 engenhos de cana-de-açúcar, ocasionando uma grande presença de mão de obra escrava africana na localidade. Os escravos africanos, trazidos de diversos lugares do continente africano (Guiné Bissau, Costa da Mina, Benguela, Congo, Cabinda, Angola e Moçambique) possuíam línguas diferentes, costumes diversos e crenças religiosas particulares de cada povo e região. Porém, para sobreviver e resistir à dor do cativeiro e à distância de seus parentes e de sua terra natal, os escravos e negros livres tratavam de se organizar em irmandades religiosas católicas, tais como as irmandades do Rosário dos Homens Pretos.




As irmandades do Rosário dos Homens Pretos eram agremiações religiosas presentes nos lugares onde havia abundância de escravos. Seu objetivo era unir os escravos e os negros livres em sua nova terra, tanto para a ajuda mútua entre seus membros, como para expressar seus anseios por liberdade. As irmandades também representavam uma forma de resistência cultural à escravidão e à dominação do homem branco, pois apesar de seguirem os ritos da religião católica, muitas de suas manifestações eram de origem africana. Entre estas, pode-se citar a presença de danças, batuques, símbolos religiosos e a tradicional coroação do Rei e Rainha do Congo.


A coroação do Rei Congo ou Congada era uma celebração realizada durantes as festas de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, que aconteciam no mês de outubro. Neste evento, eram escolhidos, entre os negros presentes, um rei e uma rainha que iriam exercer uma jurisdição simbólica sobre seus súditos. Remetendo a muitos dos mesmos rituais religiosos realizados na África, seguiam em procissão com arqueiros à frente, calungas enfeitadas, símbolos religiosos, com músicas e danças e outras manifestações culturais que dariam origem futuramente ao Maracatu.


Apesar de pobres e dos recursos limitados, e muitas vezes, à despeito de sua condição de escravos, os membros das irmandades do Rosário construíam suas próprias igrejas, se possível, tão ricas e ornamentadas como as construídas pela elite branca. Para isso, trabalhavam arduamente produzindo objetos para serem comercializados, cujas rendas eram remetidas às obras, como também pelo serviço voluntário e aquisição de esmolas. Sobre isso, assim nos fala o Padre Loreto Couto: “Os homens pretos, e captivos se mostrão tão affectuosos amor e serviço da May de Deos, a Senhora do Rosario, que elles mesmos ainda que pobres, se lhes resolverão a fundar huma fermosa Igreja, em que são elles os fundadores e administradores.” Sobre as missas realizadas nas igrejas do Rosário ainda diz o mesmo autor: “Todos os dias do anno sem que os estorve algum acontecimento catão o terço com ladainha. Nos sabbados cantão a canto de órgão a ladainha as sinco horas da tarde, e as sete da noite o terço.” Sobre a Festa de Nossa Senhora do Rosário ainda diz:” Na segunda dominga de outubro festejam a Senhora com grande solemnidade e para mayor fervor de sua devoção, formão danças, e outros lícitos divertimentos, com que devotamente alegrão o povo.”


Não se conhece a data exata de construção da Igreja do Rosário dos Homens Pretos de Muribeca, porém provavelmente é do início do século XVIII. A primeira referência sobre sua existência é do ano de 1774, quando é citada na Idéia da População da Capitania de Pernambuco, onde o templo aparece ao lado da Igreja de São Gonçalo e da Matriz do Rosário. Em 1821, é citada por James Henderson em sua obra “A History of Brazil” como sendo uma ermida de mesmo nome da Igreja Matriz. Também é citada sua existência em 1863 por Manuel Honorato em seu dicionário sobre a Província de Pernambuco. A partir do final do século XIX, não há referências sobre o templo, como também não se conhece quando nem por quê entrou em decadência e abandono até ficar em ruínas.


No ano de 1954, durante as comemorações do 300° aniversário da Restauração Pernambucana, foi celebrada uma missa na Igreja do Rosário dos Pretos de Muribeca. A cerimônia foi conduzida pelo padre da Paróquia de Jaboatão Aurino Caracciolo e o evento contou com a presença de políticos como o prefeito Humberto Barradas e senador Jarbas Maranhão. O templo já se encontrava no estado de ruínas na ocasião.



A Igreja do Rosário dos Homens Pretos de Muribeca encontra-se em processo de tombamento a nível estadual pela FUNDARPE, assim como o Povoado de Muribeca dos Guararapes. Também está tombada a nível municipal pela prefeitura de Jaboatão dos Guararapes.