segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Fontes Históricas, Pereira da Costa e Eu

Por James Davidson


Uma das grandes críticas feitas ao historiador Pereira da Costa, crítica tão repetidamente citada e comentada que já pode ser considerada como do "senso comum" dos historiadores, é justamente a que o referido autor não cita suas fontes. Daí, muitos utilizarem esse argumento para questionar a validade das informações fornecidas pelo autor em seus "Anais Pernambucanos" como se, por um grande ato de má fé, o autor inventasse tudo o que está escrito em seus 10 volumes. Não pretendo dizer que a obra está isenta de falhas e de erros, mas como bem esclarece o historiador José Antônio Gonsalves de Melo, muitas dessas falhas são fruto mais das limitações enfrentadas na época que Pereira da Costa viveu, em termos de acessos a algumas fontes, como mesmo de interpretação das mesmas. Simplesmente não acredito que ele fosse dar o trabalho de inventar tantos nomes, fatos e datas a tal ponto de preencher aqueles dez volumes.

Além disso, a própria afirmação que Pereira da Costa "não cita fontes" não é verdadeira. Autores como Manuel Honorato, Rocha Pitta, Santa Maria, Vital de Oliveira, entre outros, são citados frequentemente em sua obra. A ausência da citação das fontes de muitas informações citadas pelo autor se deve apenas a não existência do rigor acadêmico atual em citar e referenciar todos os dados, na época que o autor escreveu, como se faz atualmente. Assim, chega a ser um grande anacronismo, cobrar de Pereira da Costa a aplicação de métodos e mesmo princípios somente recentemente generalizados pela Academia como se ele tivesse vivido hoje. Sem contar que sua obra nunca pretendeu ser um "trabalho acadêmico", nem moldes atuais, nem nos moldes de sua época.

Essa mania de cobrar do passado com base nos conceitos e modelos atuais é um erro tão comum atualmente, tão generalizado, que são poucos os que ousam questionar. É uma espécie de "Etnocentrismo Cultural" dentro do tempo, onde julgo e condeno as pessoas e coisas do passado sob a ótica dos valores e princípios do tempo em que vivo. Assim, cobram de autores medievais verdades só descobertas na Idade Moderna; cobram de cientistas do século XIX informações só confirmadas no século XX; cobram da Bíblia uma classificação taxonômica só desenvolvida no século XVIII. Assim, cobramos dos que viveram no passado, que não podem se defender, sem considerar sua cultura e suas limitações.

Assim, não escondo minha admiração por Pereira da Costa. E mesmo que algumas de suas fontes tenham se perdido, é extremamente impressionante encontrar no acervo do Arquivo Público Estadual, do IAHGPE ou da Fundação Joaquim Nabuco um documento que, com muita probabilidade, Pereira da Costa conheceu. Não é difícil encontrar documentos que tenham sidos consultados por ele, mesmo não referenciados, mas que confirmam muitas das informações presentes em seus Anais. Assim, é bom ter o cuidado antes de repetir o preconceito: "Pereira da Costa não cita suas fontes", pois o fato dele não citar não quer dizer não elas não existiram.

E como Pereira da Costa, algumas pessoas fazem crítica ao meu blog pois não "cito minhas fontes". Querem que disponha na internet todas as minhas pesquisas e tentam diminuir a credibilidade do meu trabalho por se tratar de apenas um "blog". E o pior é que essas críticas partem principalmente do meio acadêmico, por pessoas que se dizem "cultas", às vezes com títulos de mestrado ou de doutorado. Às vezes feitos por pessoas que se quer pararam para ler e conhecer.

O que tenho pra dizer inicialmente é que o objetivo do meu blog nunca foi a Academia. Escrevo para a população em geral, tanto leigos como especialistas, pois tenho como princípio básico a disseminação do conhecimento de nossa cidade para seus habitantes. Meu trabalho tem como propósito ser um instrumento de divulgação, uma arma na defesa de nosso Patrimônio Histórico, do Meio Ambiente, de nossa identidade. Um instrumento na prática da Educação Patrimonial e Ambiental para o exercício da cidadania e para o fortalecimento de nossa identidade, de nossa cultura e do sentimento de pertença. 

Além disso, não pretendo satisfazer os caprichos nem se submeter aos preconceitos existentes no meio acadêmico. Infelizmente, a academia, com suas devidas e raras exceções, está repleta de gente que se diz culta, que se diz ética, que se diz socialmente correta e consciente. Mas quando observamos suas práticas diárias descobrimos ser exatamente o contrário, pois em nenhum outro lugar reinam tantos preconceitos, tanta ambição sem limites, tanta desonestidade e tanta gente sem ética disposta a tudo, sem escrúpulos nem princípios, para atingir o que querem. Um lugar onde há muito tempo se deixou de produzir um verdadeiro conhecimento, aos moldes de Paulo Freire, que é aquele com finalidade social, para se praticar uma verdadeira "masturbação intelectual" onde tudo tem como finalidade o status, seu próprio ego ou seu próprio bolso. Um lugar onde os discursos bonitos e "socialmente corretos" estão muito longe das práticas elitistas, classistas, preconceituosas, discriminatórias e excludentes presentes no cotidiano das universidades, principalmente das federais. Assim, não me surpreendo com as críticas que surgem, mais por ciúmes pela incapacidade de fazer algo melhor, que de fato pela legitimidade de seus argumentos.

Entretanto, nunca escondi todas as minhas fontes. Vasta lista bibliográfica encontra-se disponível no meu blog para aquele que se interessar em conhecer a História e Geografia do Jaboatão dos Guararapes. Como também nunca me neguei a ajudar àqueles que humildemente solicitam. Contudo, quanto a disponibilizar todas as minhas fontes e todas as minhas pesquisas, saibam que isso é fruto de 7 longos anos de pesquisas em diversos acervos de diversos tipos em diversos locais, e não posso conceder de graça aquilo que foi fruto de um longo trabalho. Ainda mais para a Academia que nunca respeitou nem valorizou o meu trabalho. Por isso, àquele que exige tal atitude de minha parte, sugiro que largue o conforto da tela do computador nos centros acadêmicos e passe a pesquisar os arquivos, jornais, documentos, iconografias, manuscritos e livros existentes nos vários acervos da cidade, como fiz por sete anos e continuo fazendo. Pois este é o trabalho de um verdadeiro historiador, e não repetir preconceitos e discursos ultrapassados, quase sempre sem fundamentos.

2 comentários:

Marcelo do Nascimento disse...

Concordo plenamente com você. Também mantenho um site (ou blog) com o mesmo perfil do seu. Nele não cito todas as fontes e pelo mesmo motivo que você: o site é para o público comum, que está mais interessado em saber da história em si do que consultar fontes primárias para fins acadêmicos. Nos livros que escrevo, aí sim, cito todas as fontes que forem necessárias. Creio que esse tipo de texto, na internet, tem que ser o mais fácil possível de se ler. O público comum não que ficar lendo um texto imenso cheio de citações de fontes e de outros autores.

Sobre Pereira da Costa, tenho a mesma opinião que você.

Não ligue para as críticas. Lembre-se que, se você é criticado, é porque está sendo visto, está chamando a atenção. O mais importante nisso tudo é tornar a história de sua cidade ao alcance de pessoas comuns. No meu caso, acho que os acadêmicos não estão interessados no meu site, e não me importo nem um pouco com isso, pois o meu alvo é mesmo o público comum.

Abraços e parabéns pelo seu site. Já faz tempos que seu blog está na lista do meu.

Abraços!
Marcelo.
Pesqueira - PE

JAMES DAVIDSON disse...

Obrigado Marcelo Nascimento pelo apoio. Seu blog estará na lista dos meus! Inclusive tem um lugar em Pesqueira que eu amo. Se chama Vila Real de Cimbres! Um abraços!