sexta-feira, 29 de setembro de 2023
quinta-feira, 14 de setembro de 2023
História do Jaboatão dos Guararapes
Por James Davidson
O
município do Jaboatão dos Guararapes está localizado na Região Metropolitana do
Recife, no estado de Pernambuco. Possuindo 258 km² de área territorial, o
território do município está limitado a leste pelo Oceano Atlântico e pela
Cidade do Recife, ao oeste pelo município do Moreno, ao norte por São Lourenço
da Mata e pela Cidade do Recife e ao sul pelo município do Cabo de Santo
Agostinho. Sua população, estimada em 2021 pelo IBGE, é de 711.330 habitantes,
estando distribuída por 7 Regionais ou Distritos: Sede (Prazeres), Jaboatão
Centro, Curados, Cavaleiro, Muribeca, Guararapes e Praias. (IBGE, 2023)
Assim
como as demais regiões do Brasil, o território do Jaboatão dos Guararapes era
habitado pelos povos indígenas. De acordo com a maioria dos cronistas do
período colonial, a etnia dos indígenas Caetés ocupava toda a região situada
imediatamente ao sul do Recife até as margens do Rio São Francisco (CARDIM,
2009). Ainda de acordo com a maioria dos autores, os indígenas Caetés
pertenciam ao grupo Tupi, falavam a língua geral e adotavam um modo de vida
muito semelhante aos demais povos tupis, vivendo do cultivo da mandioca e tendo
costumes antropofágicos (SOUSA, 2010).
De
acordo com Frei Vicente Salvador (1982), o território do Jaboatão foi palco de
resistência entre indígenas e colonizadores. Nos atuais Montes Guararapes, os
indígenas Caetés ergueram uma forte paliçada, repelindo a colonização
portuguesa naquela direção, na época da primeira fase de conquista da Capitania
de Pernambuco efetuada por Duarte Coelho de Albuquerque. Todavia, após o
falecimento deste último, e com a chegada de seu irmão Jorge de Albuquerque,
teve início uma guerra de extermínio contra os indígenas da região sul da
capitania (1560-1565), incluindo contra os Caetés, que resultou na escravização
e fuga dos membros dessa etnia e na conquista de suas terras pelos
colonizadores portugueses.
Após
a conquista das terras pelos portugueses, teve início o processo de assimilação
das terras através da doação de cartas de sesmarias. Assim, a partir de 1566,
foram distribuídas várias sesmarias de terras entre os colonos europeus, nas
margens do Rio Jaboatão e de seus afluentes. A exploração da cultura da
cana-de-açúcar foi a principal atividade econômica nesse período, com a
instalação de vários engenhos de açúcar nas terras da “Ribeira do Jaboatão”.
Desta maneira, até o final do século XVI, já estavam levantadas dezenas de
fábricas de açúcar, explorando o trabalho escravo de indígenas e de africanos.
(MELLO, 2012)
Ainda
no final do século XVI, surgem na região duas povoações que seriam os embriões
da atual cidade do Jaboatão: Muribeca, levantada em terras dos engenhos
Novo e Santo André; e Jaboatão, levantada na confluência dos rios
Jaboatão e Duas Unas, nas terras do engenho São João Batista. (COSTA, 1983) Já
na última década do século XVI são registradas a existência das igrejas
matrizes dessas povoações, Nossa Senhora do Rosário, em Muribeca; Santo Amaro
em Jaboatão, com suas respectivas festas votivas. Também se registram nesse
período a presença de capelas votivas situadas na zona litorânea do município
(N.S das Candeias e Santo Antônio da Barra) bem como festividades religiosas
nas capelas dos engenhos. (VELOSO, 1984)
No
século XVII, a história de Jaboatão seria marcada pela presença da ocupação
holandesa (1630-1654). A denominada “Invasão Holandesa” em Pernambuco provocou
muitos estragos nos engenhos da região, prejudicando a produção açucareira e
favorecendo a fuga dos escravizados (MELLO, 1981). Durante as duas Batalhas do
Guararapes (1648 e 1649) os holandeses foram vencidos nos Montes Guararapes, em
Jaboatão, ficando estes fatos registrados em vários relatos e documentos da
época. A fim de celebrar e memorizar esta vitória, foi levantada no local uma
igreja votiva dedicada à Nossa Senhora dos Prazeres, no ano de 1656. Em seu
entorno são realizados, a partir de sua fundação, uma das celebrações
religiosas mais tradicionais do estado de Pernambuco – a festa de Nossa Senhora
dos Prazeres, também chamada de Festa da Pitomba. (MELLO, 1971)
Durante
o final do século XVII e no XVIII, acontecem algumas mudanças importantes na
região. A economia açucareira, apesar das várias crises que enfrentou, passa a
ter uma maior expansão na Freguesia de Jaboatão, através da doação de novas
cartas de sesmarias ao oeste. Novos engenhos e fábricas de açúcar são
levantados nesse período. Também nesta época são levantadas novas igrejas: N.s
da Piedade, na Praia de mesmo nome, erguida em 1683; N.s do Loreto, também na
Praia de Piedade, construída em 1660; N.s do Rosário dos Pretos da Muribeca,
erguida em meados do século XVIII; N.s do Livramento de Jaboatão, construída em
1774; N.s do Rosário dos Pretos de Jaboatão, também construída em meados do
século XVIII. (VELOSO, 1982)
Ainda
no final do século XVII, ocorreu a construção da nova igreja de Santo Amaro.
Segundo o historiador Pereira da Costa (1983), o fato ocorreu porque a
primitiva matriz se encontrava em ruínas e num lugar distante do principal
centro da povoação. Assim, em 1691, numa cima de uma colina próxima à povoação,
é construída a nova Igreja Matriz, devotada ao tradicional padroeiro da
localidade:
“Um
século depois, achando-se a igreja bastante arruinada, e então mal situada,
naturalmente por se estender a povoação em direção oposta, e ficar assim
distante do centro da população, resolveu o vigário da freguesia Padre Adriano
de Almeida empreender, pelos anos de 1691, a construção de um novo templo, em
situações convenientes, o que feito, o referido vigário, a Irmandade de S.S
Sacramento e várias pessoas da localidade dirigiram um requerimento ao soberano
pedindo-lhe alguns ornamentos para a celebração do culto na igreja nova que
fizeram, o qual veio para o governador Caetano de Melo de Castro informar com o
seu parecer, por carta régia de 12 de janeiro de 1697. Além destes dados
constantes do aludido requerimento, vê-se mais que se fizera a obra do templo,
de pedra e cal, com arcos, portas, cornijas de cantaria, e com duas capelas,
tudo com a perfeição possível para com mais decência se celebrarem os divinos
ofícios, e em que se gastaram oito mil cruzados.”
(COSTA, 1983)
Politicamente,
tanto as freguesias da Muribeca como de Jaboatão estavam submetidas à Vila de
Olinda, ambas até o ano de 1711. Com a elevação do Recife à condição de Vila,
no ano de 1711, passa a freguesia da Muribeca a integrar o termo desta última.
Em 1833, com a resolução provincial de 20 de maio de 1833, Jaboatão passa
também a integrar o termo do Recife, juntamente com São Lourenço e Várzea.
(HONOTATO, 1976).
Em
meados do século XIX, a economia de Jaboatão estava baseada principalmente no
cultivo da cana-de-açúcar. Segundo um levantamento estatístico realizado em
1857, em Jaboatão havia naquele ano 45 engenhos, produzindo 56.195 pães de
açúcar e 9.507 cargas de aguardente. Para o trabalho na cana-de-açúcar, havia
um total de 3.520 escravizados, segundo a referida estatística. (MELLO, 1975)
Além
da cana-de-açúcar, na economia de Jaboatão também se destacavam os seguintes
produtos: criação de gado nas Curcuranas, cultivo de melancias nas Curcuranas, cultivo
de coqueiros e cajueiros na região das praias e de Prazeres, produção de café e
de mandioca na Muribeca, cultivos de subsistência em sítios e nos engenhos.
(MELLO, op. Cit)
No
ano de 1973, por força da provincial n° 1093 de 24 de maio de 1973, o município
do Jaboatão é desmembrado do município do Recife. O novo município criado
possuía uma extensão maior que a atual, com mais de 500 km² de área
territorial. Estavam incluídos no novo município os territórios das antigas
freguesias do Jaboatão e da Muribeca, se limitando com o Recife ao leste, com
São Lourenço ao norte, com o Cabo de Santo Agostinho ao sul e com Vitória de
Santo Antão ao oeste. Abrangia os povoados de Tejipió, Pontezinha, Prazeres,
Loreto e Muribeca, bem como todo o território que no futuro se transformaria no
município do Moreno. (GALVÃO, 1910)
No
final do século XIX, o Brasil passaria por várias transformações sociais,
econômicas, culturais e políticas que trariam também mudanças no município do
Jaboatão. Entre essas mudanças, merecem ser destacado o declínio doas antigos
engenhos banguês, que passaram a ser substituídos pelas usinas e engenhos
centrais, com capacidade industrial de moagem e produção. (ANDRADE, 1989) As
Usinas de açúcar passam a dominar a paisagem rural com seus extensos canaviais
e suas chaminés imponentes, passando os antigos engenhos a condição de meros
fornecedores de cana. Outra mudança foi a abolição do trabalho escravo, em 1888.
Como Jaboatão era um tradicional município açucareiro, muitos escravizados
abandonaram o campo, emigrando em busca de melhores oportunidades nas cidades,
enquanto outros permaneceram nos engenhos se tornando mão-de-obra barata para
as usinas.
Ainda
no final do século XIX, o município do Jaboatão seria impactado pela chegada
das ferrovias patrocinadas pelo estado e pela iniciativa privada. A primeira
dessas ferrovias a cortar o município foi a Estrada de Ferro Recife-São
Francisco. Inaugurada em 1858, atravessava Jaboatão na altura da Povoação de
Prazeres. A segunda ferrovia a ser construída foi a Estrada de Ferro Central de
Pernambuco, ligando o Recife ao interior do estado. Esta ferrovia atravessou a
sede da povoação do Jaboatão, melhorando as comunicações entre a localidade e a
capital, sendo inaugurada em 25 de março de 1885. As usinas de açúcar também
instalaram suas próprias ferrovias, como as Usinas Bulhões, Muribeca e
Jaboatão, que conectavam seus engenhos e propriedades com suas sedes através de
trilhos pelos canaviais. (PINTO, 1949)
A
sede da Cidade do Jaboatão seria bastante influenciada pela presença dos
trilhos. Além da ferrovia e da Estação ferroviária, a localidade passou a
sediar também as Oficinas Ferroviárias da região. Com a concessão do sistema
ferroviário do Nordeste para os ingleses da Great Western, a importância de
Jaboatão passou a ser ainda maior, pois ocorreu a centralização nesta cidade de
todos os serviços de consertos, reparos e até mesmo a fabricação de trens. As
Oficinas de Jaboatão foram ampliadas em 1910, se tornando a principal do
Nordeste, e atraindo para a cidade centenas de trabalhadores ferroviários. A
presença dos ferroviários em Jaboatão foi tão importante que a localidade
recebeu a denominação informal de “Cidade Ferroviária”. (CAMPELO, 1919)
Além das Oficinas da Great Western, Jaboatão também passou a contar com outras indústrias no início do século XX. Entre essas podem ser mencionadas a fábrica da Societè Cotonniére Belge-Bresilienne, uma fábrica de tecidos inaugurada em 1910, dando origem ao povoado de Vila Nathan, futuro distrito e cidade de Moreno.; A fábrica de Pólvora Elephante, situada no povoado de Pontezinha; A Fábrica de Papel Pernambucana, inaugurada em 1918, situada na sede de Jaboatão; Todas essas indústrias deram ao município do Jaboatão uma grande importância econômica dentro do estado, fazendo de Jaboatão uma cidade com uma grande presença de trabalhadores e operários que passariam a ser organizar em sindicatos, realizando greves e lutando por melhores salários. (100 ANOS...,1971)
No
ano de 1928, entretanto, o município do Jaboatão teria seu imenso território
desmembrado e dividido. Por força da lei estadual n° 1931 de 28 de setembro de
1928, o então governador do estado Estácio Coimbra divide o município do
Jaboatão, criando o município do Moreno. Desmembra o Povoado de Pontezinha,
anexando-o ao município do Cabo. E por fim, anexa o Povoado de Tejipió ao
município do Recife, retirando do município do Jaboatão mais de 200 km² de área
territorial. (ARAÚJO, 1988)
Por
conta da grande presença de trabalhadores urbanos e operários organizados em
sindicatos, na cidade de Jaboatão, o município elegeu no ano de 1948 o primeiro
prefeito comunista do Brasil, o Dr. Manoel Calheiros. A Cidade de Jaboatão
recebeu o apelido de “Moscouzinha” pela imprensa da época, denominação que
seria conhecida por todo o Brasil. Embora tenha sofrido bastante pressão das
forças políticas reacionárias da cidade, o Dr. Manoel Calheiros conseguiu
concluir seu mandato, apesar de todas as polêmicas criadas pela imprensa da
época. (VELOSO, 1982)
As
décadas de 1950 e de 1960 seriam caracterizadas por importantes transformações
econômicas e territoriais no município. No ano de 1959 o município é
atravessado pela rodovia federal Br 101, que corta o município na altura do
Distrito de Prazeres. A presença dessa rodovia e o bom momento da economia do
país na época favoreceu a chegada de várias indústrias para a região (Ford Willys,
Alpargatas, Caio Norte, etc) dando origem ao Distrito Industrial de Prazeres. A
população daquele distrito que, em 1960 contava com apenas 25.390 habitantes,
pulou para 81.868 habitantes no ano de 1970, graças ao crescimento trazido
pelas indústrias e pela expansão imobiliária nas praias. (ARAÚJO, op.cit)
Em
1965 é inaugurada na região norte do município a Rodovia 25, atual BR 232. A
presença dessa rodovia atraiu várias indústrias para o setor setentrional do
município, dando origem na década de 1970 ao distrito industrial do Curado. O
crescimento dessas regiões do município, Prazeres-Praias e Curado, distantes da
sede do município, favoreceu o desejo de emancipação dos distritos do
município, notadamente na década de 1960. Todavia, os projetos de emancipação
acabaram abortados pela justiça, com o advento da Ditadura Militar no país a
partir de 1964.
Na
década de 1980, o município do Jaboatão passa novamente por novas
transformações. A principal delas foi a construção do metrô de superfície, no
ano de 1985, que modificou significativamente o Centro da Cidade de Jaboatão. O
metrô substituiu os antigos trens suburbanos que faziam a ligação entre
Jaboatão e a capital do estado, Recife, melhorando o fluxo entre as duas
cidades. Outra mudança foi a construção de vários conjuntos residências em
várias partes do município: Dom Helder, Curado I, II, III e IV, Vila Rica,
Marcus Freire e Conjunto Muribeca, que aumentaram a população e o perímetro
urbano da cidade.
No
ano de 1989, ocorre mais uma modificação na organização política do município.
O então prefeito Geraldo de almeida Melo transfere a sede
político-administrativa do município para o distrito de Prazeres. A mudança
ocorreu em virtude do maior crescimento urbano e populacional do distrito de
Prazeres e de sua zona de influência, notadamente a zona das praias, em
oposição a antiga sede de Jaboatão, com crescimento populacional mais lento e
industrial estagnado. Assim, por força da lei municipal n°4 de 05 de maio de
1989, a sede do município é transferida para Prazeres e o nome do município
passa a ser Jaboatão dos Guararapes. (MARCENA, 2004)
A
partir do ano 2000, um novo surto de transformações passa a marcar a história
do município. A construção de uma nova Br 101 sul, através do bairro de
Comportas, favoreceu a expansão industrial por aquela direção. A partir de
2006, o município passa a integrar o Território Estratégico de Suape,
favorecendo o crescimento industrial do município, principalmente pela
Muribeca, Prazeres e Comportas. A construção da Ponte do Paiva, em 2009, trouxe
uma nova valorização imobiliária para a zona das praias. Todavia, várias
indústrias antigas entrarem em falência, como a Usina Bulhões, no ano de 2009,
e a Fábrica de Papel (Portela), no ano de 2017. A expansão urbana e industrial
acelerada, sem uma devida preocupação com o planejamento urbano, com os
direitos sociais, com o meio ambiente e com a preservação do Patrimônio
Histórico e Cultural tem sido uma característica do atual município do Jaboatão
dos Guararapes, levando à destruição e descaracterização de vários sítios
históricos, principalmente dos antigos engenhos e das vilas operárias.
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